A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty)

Assisti a 3 filmes ontem. Caça aos Gangsteres (Gangster Squad), estiloso mas vazio apesar do bom elenco. Hitchcock, fraco e desinteressante, apesar de Anthony Hopkins se esforçar em sua caracterização. E, por fim, o único filme bom que vi ontem: A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty), novo filme de Kathryn Bigelow (A Guerra ao Terror – The Hurt Locker), com Jessica Chastain.

O filme abre com o ataque terrorista às torres gêmeas, em Nova York, apenas com uma narração em off que é o suficiente para contextualizar o espectador. E encerra com o ataque terrorista de retaliação, no qual alguns soldados americanos invadiram uma casa no Paquistão e assassinaram alguns homens, inclusive um que supostamente é Osama Bin Laden, responsável pelo primeiro ataque mencionado neste parágrafo. Apesar de o filme se dizer baseado em fatos reais e de muito do que é narrado ter sido massivamente mostrado e comentado pela televisão mundo afora, não há como checar a veracidade do processo de caçada humana empreendido pelos EUA e muito menos os detalhes da emboscada final. E isso pouco importa para apreciarmos o filme, a não ser que queiramos tratá-lo como documentário e não um filme de ficção.

Maya (Chastain), agente de inteligência da CIA entra para a unidade contra-terrorista responsável por desarticular a Al-Qaeda e, principalmente, localizar Osama Bin Laden. A personagem vai ganhando força à medida que o filme (e os anos) avançam. A personagem é, certamente, amálgama de vários personagens reais, usada aqui com propósito narrativo para ser a nossa guia durante os vários anos e esforços dispendidos na tal caçada-humana.

Um dos pontos positivos do filme é a tentativa de retratar as coisas com alguma verossimilhança: sim, os americanos torturam. E também mataram inocentes. E cometeram vários erros de estratégia, que levaram à morte de mais gente, incluindo americanos. Mostra ainda como um processo como esses é lento, moroso e confuso – os anos vão saltando e vamos acompanhando episódios soltos, às vezes totalmente desconexos, personagens secundários que sempre vão se alternando ou mudando de posto, mostrando claramente como muitas pessoas estiveram envolvidas nesses 10 anos em que as atividades batizadas (pelos EUA) como Guerra ao Terror ocorreram.

Mas, para mim, o filme é um retrato intimista sobre obstinação. Não sabemos nada de Maya a não ser o que acompanhamos. O filme não quer falar de seu passado bem como mostra o desespero da personagem diante de um futuro em aberto, quando finalmente sua obstinação alcança o objetivo, com a morte de seu “inimigo”, a morte também de sua razão de viver por tanto tempo. Vida pessoal? A personagem discute, em certo momento, com uma das duas únicas pessoas com quem foi capaz de desenvolver algum tipo de conexão emocional e responde, apaticamente, “eu não sou esse tipo de menina”, sobre a possibilidade de se envolver com seu chefe. E não sabemos se ela se refere a alguma regra moral ou se apenas confessa não ser capaz de se envolver com alguém, em geral.

É interessante notar também como a “vida normal” tenta dar as caras, naquele ambiente em que nada é normal. “Vamos tomar um café ou vamos continuar a tortura?” ou ainda “Estou precisando trocar de setor… já vi homens pelados demais por aqui” são frases que ouvimos Dan (muito bem defendido por Jason Clarke), um dos amigos de Maya e também oficial de inteligência, dizer durante o filme.

Bigelow é hábil em conduzir a história de maneira a que consigamos perceber tudo isso e não nos aborrecer em suas duas horas e meia de narrativa. O filme ganha tensão em seu último terço, quando se desenrola todo o jogo político para a confirmação da operação e, finalmente, quando esta é autorizada. Chastain segura a forte personagem apesar da aparência frágil, mas quando a personagem finalmente mostra a que veio e como está disposta a tudo para defender o que acredita (e, principalmente, o seu orgulho por ter sido “ela” quem descobriu o paradeiro de OBL), rendendo algumas cenas que justificam a indicação da moça ao Oscar de atriz desse ano.

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