Guerra Mundial Z
Um dos grandes méritos do apocalíptico Guerra Mundial Z (World War Z, 2013, dirigido por Marc Forster) é retratar com firmeza e sem desvios o que poderia ser o início do fim. Há um tom de desesperança (e realidade) que respeitam a inteligência do espectador e, talvez por conta disso, pressionam o nosso peito com um peso de desconfortável suspense e aflição. Ah, sim, e há zumbis!
O filme é uma adaptação de um livro de Max Brooks e acompanha Gerry (Brad Pitt), ex-investigador da ONU, a partir do momento em que um vírus começa a propagar-se em velocidade alucinante por toda a Terra, transformando seus hospedeiros em vetores rápidos e vorazes que cerca de 10 segundos após serem infectados já estão correndo atrás de novas vítimas buscando propagar-se à mordidas.
O que mais funcionou no filme, para mim, é que o núcleo familiar e a carga emocional do personagem central são bem construídos e, portanto, soam convincentes. Somos, logo no início, apresentados a ele e sua família e já sabemos, desde então, que eles são prioridade para Gerry, em detrimento de seu ex-trabalho, que ele abandonou justamente para estar mais próximos à família. Quando, então, ele tem que “se sacrificar” para salvá-los, conseguimos vivenciar o seu dilema e entendemos perfeitamente as decisões do personagem. Gerry tem poucos elementos de “super-homem” (com um pequeno exagero na parte final, ainda assim “amenizado”), é um pai de família que tenta negociar suas habilidades para proteger aqueles que ama diante do iminente fim do mundo. Não é pouco.
Como disse antes, o recheio do filme é a desesperança… o roteiro parece ter sido escrito por um sádico disposto a criar expectativas só para fazê-las desmoronar diante de nossos olhos, levando com elas a esperança da cura e até da sobrevivência. Neste sentido, o filme é exemplar pois nos deixa sempre preparados para o improvável, convenções não são respeitadas. Por exemplo, somos apresentados ao jovem virologista destinado a encontrar a cura para o vírus através do rastreamento do paciente-zero (mote de muitos filmes deste tipo, como o recente e inferior Contágio de Soderbergh), para pouco depois nos vermos novamente sem esperança, sem pistas e com mais zumbis para preocupar-nos…
Apesar de ser um filme de zumbis, recomendo-o bastante também ao público feminino ainda que não goste do tema para ter a oportunidade de ver duas personagens femininas muito fortes e bem-interpretadas. Karin (Mireille Enos), a esposa de Gerry, e sua força interna, seu apoio sensato, seu amor maduro (e seu péssimo timing para uma ligação). Segen (Daniella Kertesz), a soldado israelense devotada que vai do patriotismo ao humanismo em um belo arco.
De qualquer forma o filme vale a visita… pelos fãs de zumbis ou de Pitt ou de ambos. Seja por ver o astro convincente ao carregar um filme com bastante ação e tensão, seja pelos rápidos, vorazes e alucinados zumbis, seja pelas pequenas pinceladas políticas como os trechos na Índia, todo o trecho em Israel e as decisões tomadas nos navios da ONU – afinal, quem merece continuar vivo e o que precisa ser salvo em uma situação limite como a exibida em Guerra Mundial Z? Dou 4 pipocas e recomendo uma boa sessão de cinema!
Um breve comentário adicional, com spoilers e recomendado apenas para quem já viu o filme.
Achei curioso todo o trecho envolvendo Israel no filme. A princípio há uma espécie de acusação política, talvez eles tenham sido os responsáveis pelo vírus já que construíram muros em volta de Jerusalém antes de qualquer outro povo. Depois, há uma reviravolta tentando coloca-los como heróis, ao mostrar que estavam sim “protegidos” mas deixando outras pessoas entrarem… e se pararmos para pensar que essas pessoas deixadas do lado de fora eram, provavelmente, palestinos (algo não mencionado diretamente no filme), teríamos até uma redenção judia! Mas, finalmente, vemos a invasão dos mortos-vivos saltando os muros e condenando os judeus a um novo holocausto, enclausurados em sua própria redoma… e se pensarmos na região como a “Terra Santa” temos além da conotação política também um pequeno apontamento religioso e, mais uma vez, cheio de desesperança.
Publicado originalmente aqui.
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