O Cavaleiro Solitário

O Cavaleiro Solitário

Pois bem, o que dizer de O Cavaleiro Solitário (Lone Ranger, 2013, dirigido por Gore Verbinski)? Começo por dizer que a nova produção da Disney que reúne diretor e astro de Piratas do Caribe é um blockbuster divertido mas muito mais longo do que deveria.

O filme se passa no período chamado de “A Conquista do Oeste” norte-americano, no século XIX, em que buscou-se levar o “progresso” ao interior do país, simbolizado pelas estradas de ferro que ligariam uma costa dos EUA à outra. Assim, vemos as belíssimas paisagens do Texas sendo cortadas por estradas de ferro e acompanhamos um pouco da rotina das pequenas vilas que se formavam à volta das estações de trem que se criavam.

É então que somos apresentados a Tonto (Johnny Depp), um índio comanche que é o narrador da história, descrevendo a uma criança os acontecimentos que acompanharemos. A história envolve os irmãos John (Armie Hammer) e Dan Reid (James Badge Dale), o primeiro um advogado idealista que acredita no poder da Justiça e recusa-se a usar armas de fogo e o segundo o xerife (ranger) da cidade, responsável por perseguir e trazer para a execução o perigoso bandido Butch Cavendish (William Fichtner), a pedido do poderoso Cole (Tom Wilkinson), o encarregado da construção dos trilhos e responsável administrativo pelo vilarejo. Temos ainda Rebecca (Ruth Wilson), casada com Dan mas que nutre sentimentos pelo irmão John… temos Danny, o filho de Dan e Rebecca, temos a cafetina Red (Helena Bonham Carter), temos o bando de Butch… enfim, temos personagens demais, o que acaba contribuindo por alongar o filme em intermináveis 2 horas e meia.

O filme narra como John vai ao inferno e volta, resgatado pelo seu cavalo branco Silver, para tornar-se O Cavaleiro Solitário. A piadinha que sempre acompanha o filme, que pergunta como ele pode ser solitário se está sempre com o Tonto não faz sentido em inglês, em que o personagem chama-se “Lone Ranger”! E, de fato, o filme destaca que ele é o último deles. Mas, “lost in translation”, não podemos dizer que trata-se do último cavaleiro…

Jack Sparrow, personagem de Depp em Piratas do Caribe, é um grande personagem e até ilustra a vitrine da coluna! O ator, novamente, está bastante à vontade como Tonto em um papel que cumpre, basicamente, a mesma função do pirata da famosa franquia: conduzir a narrativa, apoiando os heróis em suas jornadas mas, na verdade, procurando cumprir interesses próprios além de, sempre que possível, fazer gracejos seja com tiradas sarcásticas seja com olhares divertidos. E o fato de o astro aparecer maquiado (e não com o famoso e consagrado rosto) em todos os momentos do filme reforçam a minha admiração! Por falar nisso, a maquiagem do envelhecido Tonto-narrador é fantástica! Mas, curiosamente, o filme me fez lembrar também do recente Django Livre (de Tarantino), ao ver uma dupla de “justiceiros” de etnias diferentes buscando aparar contas do passado, em busca de um algoz que exerce forte poder político na comunidade.

Depp e Armie Hammer, que faz os gêmeos remadores de A Rede Social, formam uma boa dupla. Temos a clássica música-tema do personagem e o grito de “Aiou, Silver”, ainda que sem qualquer saudosismo. Há muitas cenas de ação e algumas delas um pouco repetitivas (quantas vezes ainda temos que ver alguém em cima de um trem chegando próximos a um túnel?), a trama é fraca principalmente devido ao excesso de personagens – alguns deles absolutamente descartáveis. Juntando tudo isso, o filme vale 2 pipocas… mas Depp e seu tonto valem uma pipoca adicional!

Finalmente, para justificar alguns dos pontos mais irritantes do filme para mim, escrevo esses últimos parágrafos que contém spoilers e são mais adequados apenas para quem já viu o filme.

Depp é figura carimbada nos filmes de Tim Burton e só isso explica a aparição de Helena Bonham Carter, esposa do diretor, como a cafetina Red – e sua incrível perna/shotgun de marfim. Essa personagem deveria simplesmente não existir. Além disso, a outra personagem feminina denuncia um mal-vindo machismo. O roteiro tenta nos fazer torcer pela união de John e sua cunhada, casada e mãe do sobrinho de John. Que fica viúva! OK, sou mente aberta e consigo aceitar isso, apesar de achar um tanto estranho para um filme Disney. Mas, quando finalmente a união pode acontecer, John decide ir embora pois “precisa ir” e ela fica pois ali é “seu lar”! Oras, durante a projeção vemos John justificando seu retorno ao pequeno vilarejo justamente por lá ser o “seu lar”… o que mudou? Agora ele é o “último ranger”, destinado a lutar pela justiça. OK, tá bom! E ela, depois de ter servido apenas para se colocar em perigo e ser salva pelos homens da história (até mesmo seu filho de uns 10 anos), ser cobiçada por todos os personagens masculinos da película, vai ficar lá cuidando do filho e esperando pelo retorno de “seu homem”. Que beleza!

A escolha de fazer com que Tonto narre o filme a uma criança é também, a meu ver, desastrosa. Em diversos momentos somos arrancados do filme para que o menino faça comentários realçando pequenos furos do roteiro – que o roteirista acredita que apenas porque foram questionados no próprio filme já foram solucionados… Mas essas paradas atrapalham mais do que ajudam, não divertem tanto como esperavam, além de tornar crônico o problema que já citei de tornar o filme longo e arrastado.

Publicado originalmente aqui.

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