Questão de Tempo
Eu fui ao cinema assistir Questão de Tempo (About time, 2013, dirigido por Richard Curtis) preparado para ver uma comédia romântica, tal qual vendido pelo trailer (veja esse Cine 42 Preview em que trato das expectativas geradas por ele). Para minha surpresa, o filme vai além da fórmula clássica “garoto encontra garota as eles não podem viver um romance, até que ele consegue conquista-la mas ela descobre um segredo de seu passado que coloca tudo a perder até a cena final em que eles descobrem que foi tudo um mal entendido e são felizes para sempre”. Esse gênero já nos apresentou grandes filmes, apesar da desgastada fórmula, mas o fato é que Questão de Tempo possui uma ambição maior, tentando se posicionar mais como uma reflexão sobre o tempo e como o empregamos afeta diretamente nossa vida e a nossa percepção de felicidade. Esse propósito que vai além do óbvio me agradou ainda que, para mim, o filme pudesse ser um pouco mais enxuto e, assim, ainda mais marcante e inesquecível.
Ao passar à maioridade, Tim (Domhnall Gleeson) descobre que os homens de sua família podem viajar no tempo. Como e porquê são perguntas que o filme não se incomoda em responder, posicionando-se como eu disse antes como uma reflexão sobre o efeito do tempo – em sua instantaneidade – em nossas vidas. A pergunta que parece de fato importar ao roteirista é se, afinal, pudéssemos reviver todo e qualquer momento de nossas vidas, quais deles reviveríamos e com qual motivação? Outra reflexão interessante provocada pela narrativa é como, com o amadurecimento, vemos nossas prioridades se transformarem. Assim, é natural acompanharmos Tim inicialmente, em sua adolescência, usando seus poderes para tentar conquistar a garota de seus sonhos Charlotte (a linda Margot Robbie, que interpreta a esposa de Leo DiCaprio em O Lobo de Wall Street), repetindo mais e mais tentativas de aproximação e sedução, uma motivação essencialmente egoísta, para mais tarde vê-lo mais concentrado em tentar ajudar aos outros, até vê-lo essencialmente focado em viver sua vida familiar da maneira mais intensa possível, ainda que uma única vez.
Quando citei acima que, ao contrário do que parece, não se trata de uma comédia romântica, quero dizer justamente que há muito pouco de comédia (ainda bem), ela aparece bastante orgânica à narrativa, sem absurdos ou um humor físico (tortas na cara e tropeções) que não combinariam com a história sendo contada. Além disso, apesar de haver um romance entre Tim e a encantadora Mary (vivida com delicadeza e força por Rachel McAdams), este relacionamento também não vive os desencontros típicos do gênero. É de uma linearidade e veracidade que chamam a atenção, ganhando pontos para um texto que já se apoia no fantástico em sua essência. Desta forma, a meu ver, é fantástico que os demais elementos da trama sejam tão mundanos, corriqueiros, cotidianos. É essa a grande força e a característica principal do filme, mostrar que, no fundo, nossas vidas são especiais – com ou sem viagem no tempo.
O elenco de apoio conta também com o sempre carismático Bill Nighy, interpretando o pai de Tim de forma singela. É o pai com quem todos sonham: brincalhão, compreensivo, companheiro e sábio. E quando o filme vai chegando ao seu desfecho é dessa relação entre pai e filho que vem o grande arremate e o clímax de Questão de Tempo. Justamente por ser essa a força e o foco do filme, acredito que há um pouco de elementos acessórios demais (a irmã que não se acerta, o amigo bizarro, o artista revoltado com a falta de reconhecimento de seu talento) que, ainda que ajudem a contextualizar e a mostrar o amadurecimento do personagem principal, tornam a experiência um pouco mais longa do que devia. Acredito que uma edição um pouco mais severa e um ou outro personagem a menos ajudariam a melhor o ritmo e a conferir ainda mais emoção ao tocante trecho final.
Publicado originalmente aqui.
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