Síria, Paris e Mariana

Síria, Paris e Mariana

Eu sou um alienado. Por vezes, convicto. Em outras, envergonhado. Mas é fato que eu não me aprofundo em muitos temas de interesse geral. Na verdade, o único tema de interesse geral (ou quase) que eu posso me dizer um especialista é o futebol. Portanto, para tudo o que eu disser a seguir, considerem antes de tudo isso: vocês estão lendo o texto de um alienado.

Por conta desse meu perfil eu geralmente evito falar de política aqui no 171. Eu não entendo e nem me aprofundo o suficiente para opinar como gostaria. Me interesso, não me entenda mal, mas não consigo me dedicar o suficiente para ter uma visão pessoal e adequada para tomar uma posição firme. É claro que eu as tomo, como todos tomamos, mas não o faço da forma que gostaria: informado, com uma boa visão de todos os interesses dos interessados, com uma compreensão do todo. E, assim sendo, é melhor que eu as tome no âmbito privado e sem falar abobrinha por aqui.

Mas como ficar indiferente e evitar o tema das tragédias que estamos vivenciando, seja a tragédia ambiental em Minas, seja a tragédia social e a explosão de violência no Rio, em Fortaleza e em tantas outras metrópoles brasileiras. Violência? O mundo ainda está atônito com a sexta-feira 13 e os ataques terroristas do Estado Islâmico que mancharam Paris de sangue.

Para discutir Mariana saindo da superficialidade é necessário entender em profundidade as questões relativas a mineração, ao impacto ambiental que ela causa – com ou sem desastre – mas também a geração de empregos atrelada, às responsabilidades privadas de uma empresa que era estatal até outro dia… quando ainda se chamava Vale do Rio Doce, o tal rio que agora amargou o fim de boa parte da vida que abrigava. Ao prejuízo financeiro, mas, muito mais importante, às tantas vidas perdidas – e não só as humanas, ainda que estas sejam as que mais lamentamos. Há ainda todo o efeito posterior, várias cidades sem água, pessoas desabrigadas, enfim, as consequências serão ainda duradouras e é difícil enxergar um vale em meio a tantas depressões.

Para discutir sobre os ataques em Paris saindo da superficialidade é preciso entender melhor todo o cenário do terror em que o oriente médio está inserido há tempos e do qual não vai escapar apenas com revides. Matar ou exterminar o inimigo não é uma solução. Quem é o inimigo? O que o leva a fazer o que faz? Há pessoas que simplificam igualando terroristas a muçulmanos. Imagina se fosse verdade, seriam quase um bilhão e meio de terroristas e o mundo seria um lugar ainda pior. Mas não, trata-se de uma minoria que tampouco deve ser perseguida em terra estrangeira, como defendem tantos outros. Ora, se estão fora de seu país, como refugiados é justamente pois sua terra foi tomada pelo terror, o mesmo terror que agora alcança outras fronteiras e explode vidas. E a perseguição aos refugiados é apenas um incentivo para que mais pessoas enxerguem os ditos “ocidentais civilizados” também como inimigos. Xenofobia está longe de ser solução. Quando o menino afogado virou celebridade neste mundo cão em que estamos vivendo, abrir as portas dos países aos refugiados era a única opção. Pouco tempo depois, um ato de uma minoria maluca faz com que expulsá-los de volta para a morte – desde que bem longe daqui, vocês são “todos árabes” que se entendam – se transforme em uma nova solução.

Não, eu nem quero mexer neste vespeiro. Vai muito além do que eu posso. Mas tem um lado que é mais fácil de entender e é igualmente triste. No Brasil, ao menos, as tragédias ressaltaram o triste papel do “Fiscal de Facebook”. Ele é composto por pessoas, como você e eu, que aproveitam as facilidades das redes sociais para fiscalizar as ações de outras pessoas, na maior hipocrisia e cara de pau que se possa imaginar. Essas pessoas estão aí para defender dia do saci – ainda que só lembrem do saci no Halloween. Também estão aí para apontar o dedo em todos que se manifestarem a favor da França para lembra-los que também na Síria e em outras partes há tragédias. A mesma lógica que aplicam, a de que uma vida não deveria valer mais do que outras, caberia para deixa-las em silêncio com seus julgamentos. Se eu mudasse meu perfil para as cores da bandeira francesa e isso te incomodasse, mude os seus para as cores de Minas Gerais ou da Síria, para tentar chamar atenção para a sua causa, ao invés de me dizer o que eu devo fazer. Se todos cuidássemos mais em fazer o bem pelo próximo, em amar, em ajudar… ao invés de apenas apontar o “erro” dele, o mundo já agradeceria.  O Facebook é uma ferramenta fantástica de comunicação, mas ele não vai mudar o mundo. O mundo precisa de gente pensante e agindo para transformá-lo. Há espaço para todas as solidariedades, não force as pessoas a escolher a sua. Escolha todas, ajude a todos.

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